O PDT e seu IV Congresso Nacional Reflexões sobre os rumos partidários

O PDT e seu IV Congresso Nacional
Reflexões sobre os rumos partidários

Aurelio Fernandes*

“De pouco adiantará que nós, trabalhistas, amanhã, concorramos a eleições, elejamos companheiros prefeitos, governadores, presidente da republica. Isto nada significará(...), sem que tudo isso seja respaldado por um grande partido, por quadros preparados e por soluções alternativas antecipadamente estudadas. Porque isto seria a condução de um companheiro para um cargo com uma multidão desorganizada atrás.(...) Essa é a nossa grande tarefa.(...) E se nós necessitarmos permanecer anos e anos na oposição organizando o nosso partido, não tem importância. O essencial é que o partido se organize e adquira as dimensões que o nosso povo necessita para que então esse partido seja o seu instrumento.”
( Discurso de Brizola no Encontro de Lisboa - 15/06/79 )

Hoje mais do que reproduzirmos uma discussão centrada na apologia do saber ou do culto à personalidade de nossas lideranças, devemos refletir sobre nossos 20 anos de luta partidária e os rumos de nossa organização política e do trabalhismo brasileiro.
Historicamente, o trabalhismo e toda a esquerda têm enfrentado problemas em suas organizações vinculados ao culto à personalidade de suas lideranças. A tentativa de superar essa realidade através da "substituição" de lideranças sempre fortaleceu esse mecanismo, tornando-se um ritual que prepara as condições de emergência de um novo culto ou atingindo duramente a unidade dos partidos, levando a divisões, fracionamentos e até mesmo à destruição.

A discussão interna levantada hoje pelas divergências entre os companheiros Brizola e Garotinho não deve obedecer a essa lógica. A liderança de Brizola no PDT é historicamente indiscutível. Toda a sua trajetória política de mais de 50 anos de vida pública identificada com os interesses populares o legitimam.

É no mínimo uma falta de perspectiva histórica levantar qualquer dúvida a esse respeito, seja no sentido de reafirmar ou de questionar sua liderança partidária. Garotinho tem afirmado, cansativamente, que reconhece a liderança de Brizola; logo, precisamos retirar essa discussão dos "bastidores", dos "bajuladores" e dos meios de comunicação e trazê-la para dentro do diretório estadual do Rio de Janeiro explicitando as divergências políticas e, se necessário ao diretório nacional.

Ainda assim, essa discussão não deve obscurecer ou impedir que nossas instâncias partidárias avancem no sentido de assimilar as autocríticas que o companheiro Brizola tem apontado ao partido. Em vários pronunciamentos o companheiro Brizola tem afirmado que somente com a nossa presença organizada na luta popular podemos nos identificar como uma organização política identificada com os excluídos, e que esse tem sido o papel histórico do trabalhismo. Para realizarmos esta tarefa, não podemos nos deixar seduzir por ilusões eleitorais de uma democracia determinada por interesses econômicos e que, para sofrer transformações, terá de ser movida pela pressão das lutas e das mobilizações do povo trabalhador.

A partir da derrota da emenda das diretas nosso partido assimilou essas ilusões. Afastamo-nos das lutas sociais concretas dos excluídos e afundamos cada vez mais na vala comum da participação exclusivamente parlamentar e eleitoral dos partidos de elite. Essa realidade alimentou o crescimento do eleitoralismo que subordinou toda a ação política do partido à possibilidade de conquistas eleitorais. Enfim, como diz Brizola, nosso partido aburguesou-se.
Hoje não podemos nos deixar levar pelo canto da sereia das eleições presidenciais de 2002 e reproduzir, simplesmente substituindo a candidatura Brizola pela candidatura Garotinho, as mesmas estratégias equivocadas que subordinaram a realização de nosso projeto histórico exclusivamente às eleições presidenciais.

Para retomar o fio de nossa história temos de levar à prática nossas autocríticas, sendo coerentes com nosso projeto histórico e construindo nas lutas populares dos excluídos nossas políticas pedetistas. Essas políticas orientarão a atuação de nossos militantes nos movimentos sociais organizados e nas parcelas desorganizadas do povo trabalhador, vinculando-as a uma política eleitoral identificada organicamente com essas lutas.

O IV Congresso Nacional do PDT será um momento privilegiado para apontarmos coletivamente os rumos de nossa organização política para o próximo milênio. Neste sentido estou levantando à militância e a direção partidária algumas reflexões que entendo como necessárias para discutirmos coletivamente em nosso Congresso.

Proposta de roteiro de reflexões para as instâncias do PDT
A. Questão do Socialismo e da Soberania Nacional
1. Socialismo: Um resultado inevitável do desenvolvimento das contradições do sistema capitalista ?
2. Que grupo ou classe social é o sujeito do processo de transformação social ? É necessária a existência de uma vanguarda ?
3. Qual o papel dos movimentos sociais na transformação da sociedade ? Pode combinar-se a autonomia dos movimentos de massa com a necessidade de condução política do mesmo ?
4. Unificação ou diversidade: Qual a melhor estratégia política da esquerda?
5. Deve ser o partido político a coluna vertebral do projeto socialista ? Que tipo de partido necessitamos ?
6. O socialismo tem desenvolvido conceitos surgidos do campo teórico do liberalismo, como as liberdades individuais e a democracia representativa pluripartidária. Como aprofunda-los nas sociedades contemporâneas ?
7. A nacionalização dos meios de produção e a expropriação da propriedade privada, foram consideradas depois da revolução russa como medidas inevitáveis para o desenvolvimento de uma sociedade socialista. Seguem sendo validos estes mecanismos ? Pode-se diferenciar a propriedade do controle ?
8. A luta de libertação nacional é parte integrante do projeto socialista das sociedades capitalistas dependentes ? O internacionalismo da luta socialista é uma ferramenta importante da luta de libertação nacional ?
9. No ocidente, existe um modelo cultural dominante, no qual o individualismo exagerado consiste em sua principal característica. Como resgatar e gerar um modelo cultural solidário ?
10. Os meios de comunicação massiva tem uma influência muito importante no modo de pensar. É desejável ter um controle comunitário sobre eles ? Como fazê-lo sem interferir na liberdade de imprensa ? Como limitar os monopólios educativos ?

B. Realidade Estadual, Nacional e Internacional
1. Mesmo com a “crise do socialismo” , o proclamado “fim da história” e a hegemonia neoliberal no mundo, podemos afirmar que está se processando a transição do capitalismo ao socialismo no mundo contemporâneo ?
2. É viável um projeto de desenvolvimento capitalista autônomo do Brasil ? Qual o papel do Brasil na atual divisão internacional do trabalho ?
3. Quais as conseqüências do atual modelo de desenvolvimento para o país e para o nosso estado ? Quais as conseqüências do desenvolvimento dependente para a estrutura social brasileira e as classes sociais?
4. É possível na realidade brasileira o caminho de transformações através de reformas parciais ? Estas reformas asseguram por si mesmas um caminho de construção de um poder popular através da conquista de um estado de direito socialista ?
5. Existe a possibilidade de formação de uma Frente Popular, Democrática e de Libertação Nacional entre os partidos populares? Quais partidos ou setores comporiam esta frente ? A questão “eleitoral” pode ser um impedimento ? Esta Frente é viável em nosso estado ?
6. O PDT tem condições de assumir a consolidação desta unidade do campo popular e democrático ? Qual a realidade do PDT hoje nacionalmente e em nosso estado ?

C. O PDT e os movimentos sociais
1. Como o povo trabalhador pode se inserir na luta pela libertação nacional e a construção do socialismo em nosso país ? Qual o papel das organizações sociais e das organizações políticas que representam os interesses do povo trabalhador ? Qual o papel dos órgãos de cooperação do PDT ( Juventude Socialista, Secretaria Sindical, Movimento Negro, Movimento de Mulheres, etc.).?
2. Qual deve ser a relação dos órgãos de cooperação do PDT com as entidades dos movimentos sociais ? Em que nível eles podem colaborar com a superação da crise de organização de tais movimentos ?
3. Quais bandeiras de luta e propostas podem constituir um programa que construa a unidade política do campo popular e democrático dos movimentos sociais e políticos que representam os interesses e anseios do povo trabalhador ?
4. Qual a importância das relações internacionais ?

D. O PDT sua organização e o novo estatuto
1. O PDT tem conseguido cumprir suas tarefas políticas? (Transmitir ao povo trabalhador brasileiro os princípios do trabalhismo democrático do PDT, liderar a luta do povo trabalhador por suas aspirações e reivindicações em todos os setores sociais do país, converter-se em uma força social crítica e renovadora que leve o povo trabalhador a assumir posições avançadas dentro da sociedade brasileira, ganhar e ampliar a liderança de nossa organização nas distintas expressões de massas e lutar pela educação da infância e da juventude brasileira.)
2. O PDT implementou suas tarefas no plano organizativo ? ( Planos de Trabalho nas áreas de informação, formação, organização... ) Nossas instâncias de direção funcionaram ? Em que áreas podemos avançar a partir deste Congresso ?
3. É importante garantir o planejamento e a avaliação em nossas instâncias de direção ?
4. Como aprofundar e consolidar a política de relações internacionais do PDT ? Devemos priorizar os contatos e articulações com partidos de esquerda na América Latina ? Qual a importância da presença do PDT na Internacional Socialista?
5. Devemos avançar em relação a definição de uma política de finanças no PDT ? Como ?
6. Qual deve ser a relação dos órgãos de cooperação com o PDT ? Devemos reivindicar a presença de membros das direções destes órgãos em reuniões de organismos correspondentes na estrutura partidária ?
7. Quais modificações devem ser feitas nos estatutos visando avançar na construção de uma organização política ideológica, militante e permanente ? Quais as suas bases e princípios ?
8. Etcétera, etcétera, etcétera...

E. Eleições 2000
1. Como deve ser a política eleitoral do PDT para as eleições ?
2. Como deverão ser as escolhas das candidaturas ? Devemos utilizar prévias para a escolha da candidatura majoritária ?
3. Quais os requisitos para ser um candidato do PDT ?
4. Os candidatos deverão participar de seminários e cursos organizados pelo partido onde irão aprofundar seus conhecimentos das propostas do partido ?
5. Etcétera, etcétera, etcétera...



* Mestrando de História da UFF, assessor comunitário da Federação de Associações de Moradores de Favelas do Município do Rio FAF-Rio, membro do Diretório Nacional e Estadual do PDT e diretor da Fundação Alberto Pasqualini.

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