Fio da História

“Por que tem sido de empobrecimento, de marginalismo, de degradação física e cultural, a vida dos povos latino-americanos? Quais as causas do drama da América Latina? Corresponde à tragédia social do nosso Continente a um determinismo, a uma fatalidade histórica, a uma condenação contra a qual nada conseguimos ou poderemos fazer? Se decorre do fato de sermos todos nós nações jovens – nação jovem não é os Estados Unidos? Devemos a proletarização crescente da nossa América ao clima? A nossa composição racial? (...).
Ou “não convém”, ou “não vale a pena” cogitar das causas e origens dos nossos males? Quem sabe se não é melhor passar, desde logo, à terapêutica, como preconizam os grupos e classes dirigentes da própria América Latina? Essas classes dominantes prescrevem a nossa entrega total aos “milagres” da livre empresa, do capitalismo, ao poder mágico que emana dos trustes e das corporações estrangeiras. Para tais grupos e classes a solução está em franquearmos nossas riquezas à exploração do capital estrangeiro, ao seu domínio, confiando-lhes o controle dos setores fundamentais das nossas economias (...).
E por que, tendo adotado [tal] doutrina não [conseguimos] o desenvolvimento? Por que – persiste a pergunta – não nos alçamos ao nível dos países desenvolvidos? E por que, politicamente, não conseguimos sistemas institucionais que nos conduzam ao desenvolvimento? Essa é a questão crucial. Esta é a pergunta que queima nossas consciências. Esta é a questão que desafia a nossa geração. Aceitamos o desafio. Incluo-me entre os que consideram que estamos submetidos a uma execrável injustiça. A insubmissão a essa injustiça é uma reação isenta de colorido ideológico – é reação de patriota, de cidadão e de ser humano que não se conforma com as agressões a sua dignidade e a sua própria existência.
Podem as classes dirigentes, através de seus formuladores e teorias, compor, rendilhar, articular as doutrinas que quiserem. Não nos conseguirão mais enganar. Sabemos hoje que nós, latino-americanos, somos vítimas de um tremendo processo de descapitalização. Nossas riquezas estão sendo succionadas, drenadas para fora dos nossos países. Há uma transferência contínua e crescente de nossas rendas nacionais e os frutos do nosso trabalho para outras áreas onde estão instalados os controles remotos de nossas economias. O trabalho dos nossos povos é dilapidado sistematicamente. Todo esse quadro de saque e sangria compõe o processo espoliativo que se apoia nas nossas estruturas internas, moldadas de forma a servirem aos interesses dos trustes e das corporações (...). Aqui está a matriz das inclementes injustiças sociais que vergastam as nossas populações (...)”.
(Leonel Brizola, prefácio do livro “Vais bem, Fidel!”, de Jurema Finamour, editora Brasiliense, São Paulo, 1962, páginas V-VIII).

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