SOBRE A CISÃO NA CORRENTE INTERNA DO PSOL/REVOLUÇÃO BRASILEIRA

Ao tomar conhecimento dos documentos que estão sendo tornados públicos relativo a “luta interna” e a ruptura da corrente interna do PSOL Revolução Brasileira chego à conclusão de que os dirigentes das duas frações têm razão em suas acusações.

Participei de forma militante dos comitês da Revolução Brasileira em apoio a pré candidadura de Nildo Ouriques a presidência da república pelo PSOL – que eram compostos por militantes independentes, não filiados e filiados ao PSOL, pela Esquerda Marxista e pela corrente interna do PSOL Liberdade e Revolução Popular – e me afastei em 2018 no exato momento que ficou clara a opção pela interdição ao debate sobre as propostas que surgiram sobre qual o futuro dos comitês da Revolução Brasileira em apoio a pré candidadura de Nildo Ouriques.

Já durante a campanha esse debate sobre o futuro dos comitês da Revolução Brasileira em apoio a pré candidadura de Nildo Ouriques foi atropelado pelo mesmo. Seu objetivo era criar um fato consumado em torno a sua proposta de construir uma corrente interna do PSOL articulada em torno a sua pretensão de se lançar, novamente e não mais como cristão novo, na disputa pela candidatura a presidente da República pelo PSOL em 2022. Agora, com os documentos das frações fica claro que isso se dá com a operacionalização inicial de Daniel e Mulinari e, posteriormente a sua filiação ao PSOL, de Angelica Lovatto.

Para isso Nildo implementou uma “campanha” pessoal de convencimentos para filiação imediata dos militantes não filiados no PSOL antes do encontro em que isso seria debatido e transformou – com a concordância e participação de Angelica, Mulinari e Daniel – o encontro dos comitês de avaliação da pré campanha em um encontro de fundação da corrente interna do PSOL Revolução Brasileira. O espaço inicial que seria de análise da pré-campanha se transformou em uma mesa de abertura onde Nildo exaltou um provável processo de fusão entre a EM a LRP e uma corrente que ainda não havia sido fundada.

É importante destacar o fato de que as duas correntes do PSOL – EM e LRP - que estavam nos comitês não foram sequer consultadas sobre esses encaminhamentos e acreditavam que nesse encontro iriamos discutir a construção de um espaço político de atuação conjunta que poderia ir para além do PSOL. Até pelo fato de que já havia um debate iniciado na coordenação nacional dos comitês sobre debatermos após a campanha a proposta de criação de Círculos da Revolução Brasileira que aglutinariam todos os que se somaram no apoio a pré-candidatura de Nildo, independentes de serem ou não filiados ao PSOL.

No segundo dia do encontro – sem a presença da EM e da LRP avisadas que não poderiam participar - surge pela primeira vez um documento propondo que essa corrente interna do PSOL fosse organizacionalmente leninista. Nesse momento apresentei a proposta que, divergindo desses já autoproclamados dirigentes da organização, defendia a construção de uma organização politicamente leninista e não uma corrente interna do PSOL organizacionalmente leninista, que tivesse sob sua direção uma corrente no PSOL para atuação institucional e um espaço amplo, sem atrelamento a nenhum partido institucional, para apostar inicialmente no debate e, no médio prazo, na construção de uma vanguarda compartida pela retomada da revolução brasileira, que inicialmente seria um espaço organizado pela RB (leninista), EM e LRP.

O encontro depois de um duro embate, deliberou por definirmos essa questão no congresso de fundação em janeiro de 2019, mas essa decisão foi literalmente “tratorada” pelos autoproclamados dirigentes da organização imediatamente após a realização do encontro com a divulgação da fundação da corrente interna do PSOL Revolução Brasileira.

Ler os documentos da luta interna dos dirigentes das duas frações da corrente interna do PSOL Revolução Brasileira ajudou a esclarecer algumas dúvidas sobre aquele momento, conhecer fatos que desconhecia ou apenas percebia os indícios, mas acima de tudo reforçar que a decisão de me afastar estava corretíssima e que, irônica e lamentavelmente, os dirigentes das duas frações têm razão.


Documento de afastamento de 2018

Alguns posicionamentos centrais que me levaram a se afastar do grupo que optou por construir uma corrente interna do PSOL em torno de Nildo Ouriques.

 

Todas e todos meus amigos e amigas nessa rede social sabem que participei ativamente dos comitês da Revolução Brasileira em apoio a pré candidadura de Nildo Ouriques a presidência da república pelo PSOL. Já durante essa campanha começamos o debate em relação à necessidade de definir quais os rumos futuros da militância e dos coletivos – filiados ou não ao PSOL - que foram se aglutinando nos comitês construídos para apoiar a pré-candidatura identificada com um programa da Revolução Brasileira.

Em respeito aos amigos, amigas e camaradas de militância que acompanharam por aqui esse processo ou mesmo se somaram a aquela alternativa, exponho na nota abaixo alguns posicionamentos centrais que me levam a se afastar de parte da militância dos comitês que optam por se aglutinar em uma corrente interna do PSOL em torno de Nildo Ouriques.

 

A todas e todos que participam dos comitês da Revolução Brasileira da pré-candidatura do Nildo a presidente no PSOL.

Para construir a Revolução Brasileira devemos ter todos os sentidos emprenhados de futuro, de utopia. A única forma de realizar essa tarefa é estar sintonizado com os interesses históricos do proletariado e, a partir dessa perspectiva, analisar a realidade presente e poder definir com rigor teórico o caráter estratégico e tático da Revolução Brasileira.

Estar com os sentidos emprenhados de futuro significa estar com os pés cravados na vida real do presente, confrontando a analise concreta da realidade presente com nossa utopia. Essa tarefa se concretiza no desafio de pensar o projeto histórico da Revolução Brasileira.

Para construir esse projeto histórico temos que trabalhar as três dimensões do tempo: passado, presente e futuro. Não de uma forma positivista onde o presente é prisioneiro do passado e o futuro repousa nas decisões dos grandes homens do presente, mas perceber, de uma perspectiva materialista histórica, o desenrolar da luta de classes. Apropriar-se de quais caminhos o proletariado realmente existente movimentou-se para atingir seus objetivos e como se deu a construção da consciência de classe em suas lutas.

Um projeto histórico é uma linha tênue que une fins e meios, o presente e o futuro, uma unicidade de tempo que só existe como possibilidade, e que só tem perspectiva como instrumento de mobilização na luta pelo poder. É nesse sentido, e somente nele, que Lenin cunhou a célebre, e também mal interpretada frase: “fora do poder, tudo é ilusão”. Ao contrário das representações políticas da classe dominante, os partidos do proletariado, quando perdem a perspectiva estratégica de lutar pela destruição do estado burguês, quando renunciam ao “instinto do poder”, perdem tudo.

A partir do momento em que as lideranças dos trabalhadores abandonam a perspectiva de manter sua organização autônoma e desprezam a importância da participação das massas e da organização partidária, para cair no conto de fadas do reformismo “democrático” e do mito da “conciliação de classes”, esta aberta à via para o desastre.

Somente a partir da clareza do projeto histórico podemos refletir sobre o programa, a linha política e o instrumento revolucionário necessário para a construção da Revolução Brasileira.

As fórmulas teóricas que separam consciência e ação são estéreis. Consciência critica como consciência de classe em construção e ações revolucionárias são indivisíveis, e devem se materializar em um projeto histórico através de uma linha política e de um instrumento organizativo que seja útil à defesa dos interesses de classe que representa e que não se resuma a um fim em si mesmo.

Quando abordamos o tema da Revolução Brasileira pensamos imediatamente em um programa. Mas apenas o programa ainda é muito pouco. O programa é importante, mas ele surge da clareza do projeto histórico que, expressando a dialética entre reforma e revolução, se transformará em força material a partir da implementação de uma linha política construída coletivamente por um instrumento organizativo identificado com a Revolução Brasileira.

Como todos sabem acompanhei todo o processo da pré-candidatura do Nildo a presidente no PSOL participando inclusive da coordenação nacional dos comitês indicado pelo comitê Rio. Desde o inicio levantei a necessidade de refletir os rumos da revolução brasileira para além do PSOL. Sempre considerei muito pouco a lógica de que o “PSOL é maravilhoso por que cada um faz o que quer” ou que “no PSOL podemos falar em socialismo, reforma e revolução que ninguém pode dizer não” e, portanto, “temos de ser mais PSOL do que aqueles que criticam o PSOL internamente”.

Por mais boa vontade que tenha, ao interpretar a realidade de nosso país, fica complicado não perceber a impossibilidade dessa “lógica política” contribuir para as questões estratégicas, ou mesmo táticas, da revolução brasileira.

Mas, lamentavelmente, o que tenho observado, nos encontros, debates e documentos da corrente é que a despeito da deliberação no Encontro Nacional em Santa Catarina de que decidiríamos ser ou não uma corrente interna do PSOL em um Congresso, o discurso e a política cotidiana da organização é claramente encaminhada no sentido de que somos, desde já, uma corrente interna do PSOL.

O discurso de que a maioria é filiada ao PSOL e que, portanto, é “perda de tempo” debater se somos ou não uma corrente interna do PSOL transforma-se em um sofisma a partir do momento que o Encontro decidiu não deliberar sobre isso e essa discussão foi adiada para um Congresso. E isso aconteceu mesmo depois da proposta do Nildo de que se aprovasse que o corte para ser da corrente da revolução brasileira, ou seja para o militante estar na corrente, era estar filiado ao PSOL e que os não filiados ficassem apenas na “periferia” da corrente. O curioso é que a proposta de criarmos círculos da revolução brasileira, que surgiram durante a campanha da pré-candidatura, sequer foi abordada no Encontro, no documento de avaliação, enviado cinco dias antes, ou mesmo no documento sobre formas de organização apresentado no dia desse debate, e que, sendo lembrados pelo documento da LRP após o encontro, continuaram a ser solenemente ignorados. 

Além disso, parte expressiva dos ativistas que se engajaram nesse projeto de corrente interna, defendem o PSOL enquanto o “nosso” partido em uma perspectiva estratégica, defendendo que estar no PSOL é a opção correta de “homens de partido” ou que não estar filiado ao PSOL demonstra “não entender o papel dos partidos na revolução”. Em nenhum momento isso é sequer relativizado na corrente, nem mesmo no documento com as resoluções do encontro nacional que não expressou as contradições que surgiram e que levaram a não acontecer uma tomada de decisão nesse encontro.

O "possível tem que ter rupturas, porque nós estamos atuando numa lógica de situação extrema. Nem aquilo que era 'possível' até ontem, é mais possível.” A conjuntura nos aponta a necessidade de uma organização revolucionária identificada com a TMD, para, partindo das lutas das trabalhadoras e trabalhadores da cidade e do campo, contribuir na construção da revolução brasileira. A “arte de escolher o menor mal dentro da tragédia não é uma conduta” coerente para o avanço da revolução brasileira. Se resumir a ser uma corrente interna do PSOL entendendo esse partido como o menor mal dentro da tragédia do mercado eleitoreiro da ordem capitalista dependente não contribui para avançarmos, pois “a política do factível não pode ser essa conversa do 'temos que fazer o que é possível'.”

Quando me desfiliei do PDT em julho de 2009 já afirmava minha “absoluta certeza que as esperanças de um futuro para a luta de libertação nacional rumo ao socialismo passa bem longe dos partidos institucionais que temos hoje e que se arvoram "de esquerda", "socialistas", "comunistas" e/ou "revolucionários". (...)

Hoje, todos esses partidos, mesmo aqueles que estão na oposição institucional ao petucanismo, vivem crises com seus projetos históricos muito semelhantes com o que vivenciei no PDT ou se perdem vendendo ilusões com o mercado eleitoreiro em que se transformaram os partidos políticos e as eleições.(...)

(...) Lamentavelmente muitos ainda teimam em não levar em conta que as regras institucionais garantem um imenso poder aos dirigentes e militantes que se degeneraram. Para cada lutador social e político conquistado ideologicamente, eles trazem dezenas de indivíduos que sequer sabem o que é política, mas que irão filiar-se sem pensar duas vezes se isto significar alguma possibilidade de ganho financeiro e/ou proximidade com esferas de poder que lhes garantam o atendimento de seus interesses pessoais.

Portanto, o nascimento de organizações políticas que realmente tenham a capacidade de revolucionar o Brasil não se dará no ventre putrefato desses partidos, mesmo daqueles que outrora ajudaram a fazer a história da esquerda neste país. Estas organizações serão compostas pelos órfãos destes partidos...

Serão organizações políticas de novo tipo, populares, classistas e de combate e não meros instrumentos eleitorais. Em um primeiro momento, a questão do acesso ao poder pelas vias institucionais ficará em segundo plano, a prioridade delas será contribuir para a educação política e a organização do povo trabalhador em suas lutas por reivindicações concretas. Será nessas lutas que essas organizações construirão uma unidade na ação para conformar uma frente antiimperialista, popular e classista para encaminhar as lutas pela libertação nacional rumo ao socialismo.”

Sendo assim, estou informando a todas e todos dos comitês da Revolução Brasileira da pré-candidatura do Nildo a presidente pelo PSOL que não estou mais participando da construção da corrente interna do PSOL denominada “revolução brasileira” e continuo na expectativa do encaminhamento da proposta que os camaradas da LRP colocaram em seu documento em relação aos desdobramentos políticos dos comitês.

No mais, prossigo minha militância visando contribuir coletivamente com a construção de um instrumento político partidário que afirme o caráter socialista da revolução brasileira assumindo o papel fundamental da Teoria Marxista da Dependência como instrumento de análise e contribuição para a ação política na realidade brasileira e latino-americana. Uma organização revolucionária que desenvolva uma linha de massas onde a ação direta seja a forma de ligação com os movimentos sociais capaz de conceber os trabalhadores e trabalhadoras como sujeitos e não meros objetos da estratégia revolucionária, delimitando assim com clareza o papel da organização politica revolucionária e dos movimentos sociais.

Revolucionariamente,

Aurelio Fernandes

28/07/2018

“O mundo não precisa de soldados! Precisa de guerreiros, meu irmão!

Soldado segue general e guerreiro só segue o coração!”

                                                              Guerreiro Urbano - BANDACORISCO


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