Solidariedade internacional e o compromisso com o legado de nossos libertadores

Por Aurelio Fernandes

Jornal Labareda do Comitê Antiimperilaista General Abreu e Lima do DF

 

A história da emancipação da América Latina e do Caribe foi inextricavelmente movida pelo espírito do internacionalismo e da solidariedade desde suas origens. Nossos primeiros internacionalistas eram libertadores como Francisco Miranda, Simon Bolivar, Abreu e Lima, Manuela Saenz, San Martin, José Gervasio Artigas, Bernardo O'Higgins, Antonio José de Sucre e outros que se orientavam por um profundo sentido de justiça em seus desejos de construir uma sociedade necessária, nova e mais justa.

Historiadores influenciados por uma perspectiva eurocêntrica e colonial retratam a nossa luta anticolonial como a mera substituição de uma elite europeia por uma local. Uma visão que subestima a importância do novo modelo de sociedade idealizado por seus principais arquitetos e a luta encarniçada pela sua realização. Os compromissos com os ideais de liberdade e igualdade de nossos libertadores foram tão significativos que essas mulheres e homens comprometeram a plenitude de suas vidas nessas lutas de libertação. Por mais que tenham sido derrotados pelas elites coloniais e o imperialismo, e séculos depois ainda estejamos em luta por uma segunda independência e pela nação latino-americana e caribenha, essas experiências não podem ser esquecidas ou negligenciadas.

No limiar do século XXI em um mundo em que o exercício da acumulação do capital e sua consequente dominação se realiza em escala global parece ainda mais necessário resgatar esse legado: a solidariedade deve ser inseparável de sua vocação internacionalista e de classe.

Pensar a solidariedade internacional nos dias de hoje nos leva a refletir sobre a necessidade de apostar em uma articulação dos excluídos, desprezados, dominados e explorados em escala mundial, incluindo os que vivem nos países desenvolvidos; uma coordenação, cooperação e alianças entre os sujeitos políticos e sociais que participam nas lutas emancipadoras procurando a construção de identidades mundiais que combatam radicalmente a ordem capitalista.

Para isso é necessário elaborarmos uma estratégia internacionalista em nossa Pátria Grande que ponha em xeque o capitalismo em nossa região a partir do campo político, estatal ou não-estatal, militante ou não-militante, partidário ou não-partidário, dos movimentos de luta populares e classistas, dos complexos técnico-científicos, dos centros culturais e comunicacionais.

Será essa estratégia que permitirá a articulação com forças que operem nos três grandes blocos de poder mundiais e contribuirá com a construção de alternativas revolucionárias em escala mundial para a superação mundial da sociabilidade do capital com a participação e o protagonismo dos excluídos, desprezados, dominados e explorados.

Esta realidade impõe uma redefinição substancial do que conhecemos por solidariedade internacional, no sentido de acentuar a importância e a relevância do internacionalismo revolucionário, especialmente se as classes e os setores sociais explorados e oprimidos querem intervir para realmente destruir a ordem capitalista, hoje neoliberal, que está impossibilitando um futuro para as maiorias.

Precisamos articular em diferentes instâncias um conjunto de sujeitos políticos revolucionários, movimentos populares e classistas e organizações civis e culturais contestadoras da sociabilidade capitalista em torno de um programa de ação comum que permita mobilizar a opinião pública internacional e organizar a solidariedade entre a classes trabalhadora, povos e nações com o objetivo de superar o capitalismo.

Precisamos de espaços originais e flexíveis de coordenação e ação comum de todas as forças transformadoras do mundo e especialmente de seus componentes anti-sistêmicos, marxistas, anticapitalistas, socialistas e comunistas para enfrentar as consequências do aprofundamento da crise capitalista que foi ampliada exponencialmente pela pandemia.

Temos de nos opor a ofensiva imperialista do grande capital que pretende jogar nas costas dos excluídos, desprezados, dominados e explorados o custo da crise e da pandemia. Necessitamos de uma contraofensiva das forças alternativas ao grande capital, capazes de barrar sua arrogância militar, sua nefasta ação econômica imperialista e sua arrogância avassaladora. Será nessa contraofensiva que poderemos constituir um sujeito social revolucionário mais diversificado e complexo e uma solidariedade internacional, ampla, diversa e radicalmente transformadora que seja a base de um internacionalismo revolucionário eventualmente capaz de derrotar o domínio do grande capital e apontar para um processo mundial de transição ao socialismo.

Na pátria grande é necessário se retomar com radicalidade o projeto bolivariano de integração independente e não subordinada da América Latina e o Caribe proposto por Chávez e Fidel. Apostar em um bloco com pressão e capacidade de negociação próprias que busque uma inserção mais favorável da América Latina e Caribe, e de todo o Sul ao mercado mundial.

Como uma região saqueada, explorada, e submetida historicamente às imposições dos grandes centros imperialistas, é necessário exigir compensação e regulamentos justos. As características de nossos países e nosso subcontinente, essencialmente dependentes dentro da atual ordem capitalista mundial, requer esquemas de integração zonal, sub-regional e regional Caribenho-latino-americanos que permitam atitudes de pressão e rebeldia como forma de conquistar espaços e chegar a acordos com os países centrais e seus respectivos blocos.

Como foi inicialmente encaminhado por Chávez, a integração da Pátria Grande surgiria da soma e articulação de integrações sub-regionais – a exemplo da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos CELAC, a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (Alba) e a União de Nações Sul-americanas (Unasul). Entidades que buscavam cobrir todos os aspectos: econômico, social, ambiental, cultural, político, militar dessa integração. Uma integração que tinha como perspectiva a necessidade de um crescente processo de unidade entre as forças patrióticas, revolucionárias, populares e classistas em luta das várias nações.

Esses esforços de integração que rejeitam a subordinação, enfrentando a condição atual de países dependentes, devem ser acompanhadas em nossos países por enormes lutas pela conquista da segunda independência e pela conformação de alternativas anti-imperialistas de transição ao socialismo capazes de romper com a dependência.

A solidariedade internacional pode e deve contribuir nesse processo de criação, cooperação, unidade de ação, coordenação e integração construindo pontes para a unidade dos setores populares e classistas em nossos países que apostem em mudanças e transformações internas que coloquem em primeiro plano o comprometimento com a unidade latino-americana, caribenha e do sul.

Uma solidariedade internacional que deve ter como objeto e finalidade a defesa do atendimento às necessidades e demandas urgentes dos povos e nações em luta na América latina e Caribe  e buscar uma aliança ainda mais ampla em torno das demandas de todos os povos e nações em luta da periferia dependente do sistema capitalista, articulando ações comuns e o fortalecimento da capacidade de pressão contra os países imperialistas para forçá-los a pagar a grande dívida social gerada pela exploração secular do imperialismo.

Este é caminho para os que ousam implementar uma solidariedade internacional identificada com o legado de nossos libertadores e contribuir para o desenvolvimento independente das forças produtivas, espirituais e culturais de cada nação da América Latina e Caribe e de nossa mátria grande.

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